Ensaio Energético

Fundos Soberanos baseados em recursos naturais: objetivos, funções e experiências no Brasil

1. Introdução

Por pelo menos 50 anos, os chamados ‘fundos de riqueza soberana’ (FRS) tem se proliferado pelo mundo. No Brasil esse movimento é recente (cerca de uma década), apesar do tema já ter sido discutido anteriormente em fóruns setoriais, de governo e academia.

Muitos fundos soberanos foram estabelecidos por governos que ao observarem grandes fluxos de receitas fiscal buscaram diversificar seus dispêndios e/ou estabilizar seu orçamento. Apesar de ser um grupo heterogêneo (motivações, estrutura e estratégias de investimento), uma parte importante desses fundos são baseados em recursos naturais como petróleo, gás natural e outros minerais (diamantes, ouro, cobre, etc.). Existem ainda aqueles baseados em reservas de divisas estrangeiras, resultado de superávits comerciais, como é o caso de países asiáticos (China, Coréia do Sul, etc.), ou ainda aqueles baseados em doações estrangeiras (ilhas do Pacífico) ou de outros recursos fiscais (Cingapura) (WB, 2018).

Em 2020, existiam um total de 66 fundos soberanos de diversas modalidades, com mais de US$ 8,6 trilhões de ativos sob gestão em todo o mundo (PREQIN, 2021).

Tendo em vista, a natureza exaurível dos recursos minerais produzidos e a volatilidade das rendas minerais recebidas, muitos países e governos subnacionais tem adotado através da criação de FRS estratégias e mecanismos de estabilização fiscal e poupança intergeracional, com regras variadas de gestão e alocação das receitas arrecadadas buscando evitar choques orçamentários no curto prazo ao mesmo tempo gerando benefícios no médio e longo prazo.

Este artigo tem como objetivo apresentar os princípios e papel de fundos de riqueza soberana a partir de recursos naturais e explorar as experiências de FRS no Brasil, como foram implementados e descrever suas estruturas e características diferenciadas.

2. A economia dos recursos naturais

A Economia dos recursos naturais trata das questões da exploração, desenvolvimento, produção e uso de recursos ao longo do tempo. Muitos dos recursos são não renováveis (ou exauríveis) não tendo capacidade de reposição na escala e tempo comparável ao da produção e usos humanos. Por este mesmo motivo, as atividades de recursos não renováveis como o petróleo, gás natural, carvão e demais minerais, são classificadas como indústrias extrativas.

Estes produtos minerais são utilizados em diversos segmentos da economia moderna. Seu valor nos mercados internacionais é conhecidamente volátil, associando períodos de oferta flutuante, ora abundante ora escassa, com uma demanda inelástica e historicamente crescente. Por este motivo, igualmente volátil serão as receitas de venda destes recursos naturais, em particular da arrecadação de governos locais onde as reservas minerais se encontram.

Existe nas ciências sociais uma vasta literatura que trata do fenômeno chamado de “maldição dos recursos”, onde países com grandes reservas minerais, apresentam desempenho econômico e governança pior do que aqueles de menor dependência por recursos naturais (Humphrey et al. 2007). Este seria um paradoxo dada as oportunidades de geração de riqueza nacional a partir de dotação pré-existente de recursos. Este fenômeno não seria uma regra geral ao desenvolvimento, existindo claras exceções (e.g. Noruega) [1]. Um sintoma discutido nesta literatura é a chamada “doença holandesa”, onde em momentos de grandes fluxos de renda e absorção de divisas internacionais, surgem movimentos de concentração econômica para a atividade extrativa, pressionando a demanda interna (e.g. inflação de mão-de-obra e serviços) e deslocando outras atividades (e.g. desindustrialização).

Uma das práticas sugeridas por esta literatura para se evitar problemas no desenvolvimento econômico e social é justamente o planejamento transparente do orçamento público e a constituição de FRS.

3. Fundos de Riqueza Soberana: objetivos e funções

De acordo com o International Group of Sovereign Wealth Funds, os FRS podem ser definidos como fundos de propriedade do governo para investimento em fins especiais, principalmente para fins macroeconômicos. Em 2008, foram estabelecidos os Princípios de Santiago que trazem princípios e práticas voluntárias, aceitas entre diversos FRS, refletindo tanto arranjos de governança e responsabilidade quanto práticas de investimento prudentes e sólidas.

Além de estabelecer um objetivo claro, são quatro as decisões básicas na definição de um FRS:

  • regra de poupança;
  • regra de retirada;
  • política de investimento;
  • governança.

O nível de arrecadação, alocação e uso destas receitas irá depender das estratégias governamentais que se associam ao planejamento do orçamento público.

As funções de FRS variam e podem ser classificadas da seguinte maneira (JPMorgan Research, 2008):

  1. Estabilização de receitas: os fundos de estabilização de receita são projetados para amortecer o impacto das receitas voláteis de commodities sobre o saldo fiscal do governo e a economia em geral.
  2. Fundos de Poupança: os fundos de poupança (geração futura) destinam-se a investir receitas ou riqueza em períodos de tempo mais longos para necessidades futuras. As fontes desses fundos são tipicamente baseadas em commodities ou recursos fiscais. Em alguns casos, esses fundos são destinados a finalidades específicas, como cobertura de responsabilidades futuras com pensões públicas.
  3. Gestão de participações governamentais: os fundos de gestão de participações administram os investimentos diretos de seus governos nas empresas. Podem ser empresas estatais nacionais e empresas privadas, bem como empresas privadas no estrangeiro. A retenção de fundos normalmente se associa a estratégia nacional de desenvolvimento do governo.
  4. Fundos genéricos ou híbridos: fundos que cobrem um ou vários dos três objetivos anteriores, mas seu tamanho tende a ser tão grande que o objetivo principal é otimizar o perfil geral de risco-retorno do patrimônio existente. Esses fundos geralmente administram parte das reservas estrangeiras “excedentes”.

A primeira função é de mais curto prazo com o objetivo de estabilização do orçamento governamental reduzindo impacto de choques macroeconômicos. A segunda função é de mais longo prazo, cujo objetivo é criar uma reserva de riqueza para as gerações futuras e para funções específicas associadas ao desenvolvimento nacional. Ao reservar recursos de forma separada ao orçamento, outro objetivo é o de auxiliar na redução da dependência de uma determinada fonte de receitas volátil. Os fundos de participação, não necessariamente se associam a recursos naturais, mas não é incomum que esta função se inclua em fundos híbridos.

Tabela 1 – Exemplo de Fundos Soberanos baseados em recursos naturais no Mundo

Fonte: Elaboração própria a partir de NRGI (2012) e PREQIN (2021).

A Tabela 1 apresenta exemplos de FRS baseados em recursos naturais pelo mundo. A maioria deles é baseada nas rendas petrolíferas.

O Fundo do Petróleo Norueguês (Norway’s Government Pension Fund Global) é sem dúvida a referência dos FRS baseados em receitas de petróleo. Ele foi estabelecido em 1990 e hoje é o maior FRS do mundo. Este fundo investe em uma variedade de ativos apenas no exterior (ações, renda fixa e imóveis) que já representam mais da metade do rendimento do fundo. De acordo com sua gestora (Norges Bank), ele detém participações em cerca de 9.000 empresas em 74 países, possui centenas de edifícios (aluguéis) e realiza empréstimos a países e empresas. Quase 20% do orçamento anual do governo norueguês advém de resgates de rendimentos deste fundo. Em média, o governo gasta o equivalente ao retorno real do fundo (cerca de 3% a.a.). Este repasse exerce uma função contracíclica com uma regra fiscal que garante que não se gaste mais do que o retorno esperado do fundo.

Apesar da referência norueguesa, a variedade de experiências internacionais traz lições importantes quanto a modelos e práticas a serem adotadas ao se constituir um fundo baseado em recursos.

4. Fundos soberanos de petróleo no Brasil

Com uma produção de petróleo e gás natural crescente, o Brasil tem se posicionado como um grande produtor de hidrocarbonetos globalmente. Apesar da importância da atividade, em uma perspectiva agregada, o país tem uma economia diversificada, portanto, seu grau de dependência nesta atividade não é tão elevado como é o caso de grandes produtores internacionais (Arábia Saudita, Rússia, Emirados Árabes, etc.). No entanto, quando observamos os impactos da atividade na esfera subnacional, é possível observar uma maior dependência de suas receitas fiscais, explicando o interesse de alguns entes subnacionais em criar FRS.

O incremento da arrecadação governamental a partir do petróleo e gás natural tem crescido ao longo do tempo. Apesar do aumento dos volumes produzidos, grandes variações de receitas têm sido observadas sobretudo pela volatilidade dos preços internacionais dos produtos e da variação da taxa de câmbio. O Gráfico 1 apresenta essa variação de receitas ao longo do tempo e sua distribuição aos entes federativos.

Gráfico 1 – Distribuição de royalties e participações especiais segundo beneficiários

¹exclui valores destinados ao Fundo Social, Educação e Saúde sob gestão da União. ²Fundo Especial a ser distribuído entre todos os Estados, Territórios e Municípios.

Nota: Valores referentes a distribuição de royalties e participações especiais, i.e., não inclui excedentes em óleo e gás natural da União no regime de partilha.

Fonte: Elaboração própria com dados ANP.

Note que desde 2012, parte crescente do que é destinado a esfera da União é contabilizada como Fundo Social, Educação e Saúde. Como será descrito a frente, esta divisão se iniciou a partir do debate quanto ao futuro das receitas arrecadadas a partir dos grandes volumes a serem produzidos no Pré-sal.

Além das participações que são fiscalizadas pela ANP (apresentadas Gráfico 1), com a adoção do regime de partilha de produção nas áreas do Pré-sal, ainda existem montantes adicionais que advém da comercialização de volumes de petróleo e gás natural excedentes de propriedade da União. De acordo com a Pré-Sal Petróleo SA (PPSA), de 2018 a 2021, o valor acumulado do excedente de óleo e gás natural da União comercializado atingiu R$ 3,45 bilhões (PPSA, 2021).

Além da arrecadação federal, note que a arrecadação subnacional (Estados e municípios) cresceu muito, e a redistribuição entre estes entes é determinada por regulação e regras fiscais consolidadas (apesar de ser frequente as disputas quanto aos valores devidos). Note que a distribuição destes recursos é maior em Estados e munícipios que são sede das atividades petrolíferas ou cuja proximidade justifique uma compensação financeira. Por exemplo, alguns munícipios do Estado do Rio de Janeiro que são considerados afetados tem como a principal fonte de receitas as participações governamentais do petróleo e gás.

Considerando a perspectiva de uma arrecadação crescente e volátil, ao mesmo tempo a necessidade de criar trajetórias de desenvolvimento, destacamos e apresentamos breve descritivo de algumas das experiências brasileiras de FRS.

4.1. Fundo Social (Pré Sal)

O Fundo Social (FS) foi criado pela Lei Federal nº 12.351/2010 (Lei da Partilha), e alterado pela Lei nº 12.858/2013 que tratou da destinação de 50% de seus recursos para a Educação e Saúde. O FS foi criado com a finalidade de constituir fonte de recursos para o desenvolvimento social e regional. No entanto, desde sua criação em 2010, não houve regulamentação e implementação do fundo, o que acabou tornando seus recursos uma fonte de disputas políticas ao longo do tempo. Em 2020, por exemplo, discutiu-se desde sua extinção até mudanças na distribuição de suas receitas, trazendo disputar pela destinação à Estados e municípios, além da constituição de fundo para apoio à expansão de gasodutos (SENADO FEDERAL, 2020).

Passada uma década, se o FS tivesse acumulado recursos desde sua criação, o montante arrecadado, apenas considerando os aportes de suas fontes de recursos, seria da ordem de R$ 90 bilhões. No entanto, em 2019, seu saldo em caixa se situava em R$ 35 bilhões (CGCONT, 2020).

4.2. Estado do Espírito Santo

O Fundo Soberano do Estado do Espírito Santo (Funses), considerado por alguns como o principal exemplo, foi criado em 2019 pela Lei Complementar n° 914/2019 e regulamentado pelos Decretos nº 4.765-R/2020 e nº 4.845-R/2021. Até junho de 2021, o FUNSES acumulou de saldo R$ 509 milhões.

Vale mencionar que também foi criado em 2019, o Fundo Estadual para o Financiamento de Obras e Infraestrutura Estratégica objetivando o desenvolvimento do Estado. Este outro fundo surgiu em decorrência do acordo de unificação dos campos no Parque das Baleias [2], firmado entre a ANP e Petrobras, destinando valores retroativos do acordo ao fundo.

O FUNSES é um fundo híbrido, subdivido entre a função poupança e função de desenvolvimento. O Banco do Estado do Espírito Santo (BANESTES) é o responsável pelos recursos direcionados à poupança e o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (BANDES) é responsável pela gestão de recursos destinados à desenvolvimento (investimentos em participação e atividades no Espírito Santo).

Com relação a função desenvolvimento, em maio de 2021, foi aberto processo de licitação para contratar empresa privada para administrar R$ 250 milhões do fundo. O objetivo é, a partir de 2022, realizar investimentos do tipo “venture capital”, ou seja, adquirindo participações em empresas que atuem localmente. O objetivo é fomentar investimentos desde áreas tradicionais (como confecção, têxtil e calçados) até áreas da economia criativa e nanotecnologia.

4.3. Estado do Rio de Janeiro

O FRS mais recente é o do Estado do Rio de Janeiro. Foi promulgada em 01 de junho de 2021 a Emenda Constitucional n 86/2021 criando o Fundo Soberano do Estado do Rio de Janeiro, cuja regulamentação será feita por meio de lei complementar.

Além da constituição de poupança e estabilização, o fundo carioca pretende que seus recursos possam ser destinados a ações estruturantes em áreas como saúde, educação, segurança pública, ciência e tecnologia e meio ambiente (sendo necessária regulamentação).

Note que os recursos absorvidos por este fundo se concentram na volatilidade das receitas, i.e., o fundo capta 30% do excesso de receitas relativamente ao exercício financeiro anterior, o restante deste excesso seguirá sendo destinado a capitalização dos fundos de Desenvolvimento Social e do Meio Ambiente e ao sistema previdenciário do estado (RioPrevidência). O maior desafio da implementação no curto prazo para o Estado de Rio de Janeiro é o fato de que este se encontra em uma situação fiscal fragilizada, aderindo ao regime de recuperação fiscal junto à União.

4.4. Município de Maricá

Em 2017, através da Lei n. 2.785/2017 foi criado o chamado Fundo Soberano de Maricá (FSM). Em 2019, alterações foram realizadas para incluir a possibilidade de uso do fundo por dificuldades orçamentárias (Lei n. 2.902/2019) e, além disso no mesmo ano, ele foi incluído na lei orgânica do município. Atualmente o FSM tem cerca de R$ 550 milhões.

4.5. Município de Ilhabela

Ilhabela é um dos municípios que mais arrecada royalties e participações especiais pela produção na Bacia de Santos, a partir dos campos de Sapinhoá, Sapinhoá Norte, Mexilhão e Lapa [4].

O Fundo Soberano do Município da Estância Balnearia de Ilhabela (FSMI) criado em 2018, pela Lei Complementar n 1.333/2018. Ao longo do tempo o patamar de receitas fiscais oriundas das atividades de petróleo e gás natural cresceram a um patamar de cerca de 50% do orçamento da cidade, em particular devido as atividades no campo de Sapinhoá Norte. O fundo conta com R$ 275 milhões.

Diferentemente de outros fundos, é vedado o uso do FSMI na concessão de garantias e vinculação de resgates dos recursos à aplicação em despesas obrigatórias continuadas. Não houve resgate até o momento do fundo, mesmo durante a pandemia.

A lei complementar nº 1.359/2019 cria o Conselho Municipal de Acompanhamento das Aplicações dos Recursos Financeiros Provenientes dos Royalties (Confiro) para que a sociedade possa decidir, em conjunto com a prefeitura, a aplicação dos recursos.

À imagem do Estado do Espírito Santo, existem propostas de criação de um fundo de investimento em participações (FIP) para destinar cerca de 10% do fundo soberano para fomentar a atração de empresas nas áreas de sustentabilidade e tecnológicas.

4.6. Município de Niterói

O Fundo de Equalização de Receitas do Município de Niterói (FER) foi criado em fevereiro de 2019 por meio de emenda da Lei Orgânica nº 41/2019 e regulamentado pelo Decreto nº 13.215/2019. Ao longo do tempo as receitas da atividade de petróleo e gás natural no município se tornaram cada vez mais relevantes e a 35 – 40% da receita total, sendo ao mesmo tempo muito voláteis. Atualmente, o FER tem cerca de R$ 270 milhões de saldo, com uma projeção de atingir R$ 2,8 bilhões até 2040.

Para financiar as ações durante a pandemia foi realizada retirada de R$ 200 milhões para demandas de investimentos na saúde, transferência de renda (renda básica) e suporte à empresas para suporte financeiro para capital de giro (Programa “Supera Niterói”) e manutenção de empregos.

5. Conclusões

Os Fundos de Riqueza Soberana (FRS) baseados em recursos naturais são cada vez mais comuns em locais que observam não apenas oportunidades de melhor planejar seu desenvolvimento e oferecer bem-estar a gerações futuras, mas também contornar a ‘maldição de recursos’ e evitar impactos econômicos negativos durante choques orçamentários e do declínio da produção de recursos extrativos.

Como foi apresentado, os FRS são bastante heterogêneos e devem apresentar estruturas legais, institucionais, de governança e regras para depósito e retirada. A especificação das funções e objetivos de um fundo soberano é determinada por fatores econômicos e políticos, que dependem da natureza da fonte de recursos subjacente, o desenvolvimento econômico e institucional local, o grau de diversificação das fontes de receita pública e os compromissos públicos estabelecidos para o longo prazo. Portanto, não há solução única de FRS, sendo uma decisão sobretudo política, desde a decisão de criá-lo até a determinação de seus objetivos e formas de gestão.

Em momentos de crises orçamentárias, como no caso recente da crise do COVID-19, surgem expectativas quanto ao uso dos recursos dos FRS. Muitos governos nacionais e subnacionais recorreram a retiradas e empréstimos dos fundos. Mesmo que numa perspectiva de valor global dos FRS, retiradas não passaram de 3% do total acumulado (NGRI, 2020), em países como os da América Latina, retiradas foram substanciais, apoiando políticas de enfrentamento a pandemia (no Chile 22%, Trinidade e Tobago 15%, Peru 105%) (IE Business School, 2021). Assim, o espaço fiscal que os FRS oferecem favorece a superação de crises dando opções contracíclicas para os governos. Por outro lado, o uso indiscriminado dos fundos em momentos de bonança torna mais severos os impactos nos momentos de crise. Neste sentido, é muito importante se estabelecer de forma clara a governança e as regras de depósito e retirada evitando usos discricionários e injustificados.

Há uma grande variedade de experiências no mundo, que trazem lições quanto às condições em que fundos são estabelecidos, suas regras de captação, alocação e usos. No Brasil, a criação de fundos baseados no petróleo é relativamente recente, existindo casos de relativo sucesso (e.g. FUNSES) e outros de dificuldade de implementação (e.g. Fundo Social). Sendo bastante recentes, os fundos de Estados e municípios descritos aqui ainda tem importantes desafios a serem superados no que trata:

  1. da busca por transparência na gestão dos fundos, para que a sociedade possa entender suas finalidades e importância.
  2. da política e alternativas de investimento disponíveis e os custos de oportunidades de se adotá-las. Nesta discussão existe o debate sobre quais serão os agentes gestores e se as aplicações devem ou não ser direcionadas às economias locais (aumentando a exposição a riscos específicos de investimento).
  3. das incertezas quanto às receitas futuras em face não apenas do declínio das reservas, mas da transição energética e seus impactos na demanda por hidrocarbonetos.

Finalmente, vale destacar que no caso brasileiro a simples vontade de se criar fundos soberanos, independentemente de seus objetivos e estruturas, levanta a necessária discussão quanto ao planejamento do orçamento público no longo prazo e de meios de assegurar melhores condições e desenvolvimento locais, portanto, buscando superar os desarranjos orçamentários crônicos enfrentados no curto prazo.

Notas

[1] Noruega apresenta indicadores de desenvolvimento elevado e outros países como Argentina, Catar, Emirados Árabes e México apresentam indicadores médios para altos. No entanto, muitos países produtores de petróleo, em particular na África, se encontram com indicadores muito baixos (Guiné Equatorial, Gabão, República do Congo, Nigéria e Angola).

[2] Parque das Baleias compreende as áreas de desenvolvimento de Baleia Anã, Baleia Azul, Baleia Franca, Cachalote, Caxaréu, Mangangá, Pirambu e o campo de Jubarte, originadas do bloco BC-60, na Bacia de Campos.

[3] Participações especiais são receitas provenientes de campos de grande rentabilidade ou volume de produção no regime de concessão.

[4] https://epbr.com.br/fundo-soberano-para-royalties-em-ilhabela/

Referências

CGCONT (2020). Demonstrações contábeis e notas explicativas 2019. Coordenação-Geral de Contabilidade e Custos – Presidência da República. 1a edição. Brasília 2020 https://www.gov.br/secretariageral/pt-br/centrais-de-conteudo/demonstracoes-contabeis/2019_DCASP_v.05.pdf/@@download/file/2019_DCASP_v.05.pdf 

Humphreys, M.; Sachs, J., Stiglitz, J. (2007). What Is the Problem with Natural Resource Wealth? Capítulo 1. In: Escaping the Resource Curse. Columbia University Press. 2007 https://policydialogue.org/publications/working-papers/what-is-the-problem-with-natural-resource-wealth/

IE Business School (2021). Sovereign Wealth Funds 2020: Fighting the pandemic, embracing change. ICEX-Invest in Spain | IE Business School. 2021 https://www.investinspain.org/en/publications/sovereign-wealth-funds-2020

JPMorgan Research (2008). Sovereign Wealth Funds: A Bottom-up Primer. May 2008

NRGI (2012). Natural Resource Funds. https://resourcegovernance.org/resource-governance-index/report/natural-resource-funds#_edn2

NRGI (2020). How Have Governments of Resource-Rich Countries Used Their Sovereign Wealth Funds During the Crisis? Blog. 21 August 2020 https://resourcegovernance.org/blog/how-have-governments-resource-rich-countries-used-their-sovereign-wealth-funds-during-crisis

PPSA (2021) Painel Interativo PPSA. Pré Sal Petróleo S.A. https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiOTQ0NGRmMzgtM2VmMC00MDc2LThmNjQtZGY1ZGJmMjY3MjcyIiwidCI6IjdmZTE1YjliLTExNjktNGIzYS1iZTIxLTNiNTRhOWQxOWExOSJ9 

PREQIN (2021). Preqin Sovereign Wealth Funds In Motion. May 2021. https://www.preqin.com/insights/research/reports/sovereign-wealth-funds-in-motion

SEFAZ-ES (2021). Fundo Soberano: Relatório de Desempenho. Março 2021. https://sefaz.es.gov.br/Media/Sefaz/Tesouro%20Estadual/Fundo%20Soberano/Relat%C3%B3rio%20de%20Desempenho%20do%20FUNSES.pdf

SENADO FEDERAL (2020). Extinção do Fundo Social e Financiamento da Educação. Boletim Legislativo: Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa. nº 87. Setembro 2020 https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/boletins-legislativos/bol87

WB (2018). Note on stabilization / wealth funds: a case study analysis. World Bank Group. April 2018. https://documents.banquemondiale.org/fr/publication/documents-reports/documentdetail/908941526042996775/note-on-stabilization-wealth-funds-a-case-study-analysis

Outros sites:

Sugestão de citação: Tavares, F. B. (2021). Fundos Soberanos baseados em recursos naturais: objetivos, funções e experiências no BrasilEnsaio Energético, 09 de agosto, 2021.

Autor do Ensaio Energético. Economista e doutor em Economia pela UFRJ, mestre em Economia e Gestão de Indústrias de Rede pela Universidade de Comillas (Espanha) e Paris Sul XI (França) e Fulbright scholar na Universidade de Columbia (Estados Unidos).

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Luciana Venancio
Luciana Venancio
2 anos atrás

Parabéns pelo excelente artigo!

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